O que devemos enxergar além do projeto?

Publicado em: 29/06/2018

*por Rosemeire Herrera Demarchi

 

O que devemos enxergar além do projeto?

 

Quando falamos em projeto malsucedido, logo nos vem à cabeça aquelas fotos que circulam entre colegas onde a papeleira fica fora do alcance de quem usa o vaso sanitário ou a torneira que é curta demais para o lavatório.

Será que são erros de projeto? Será que ninguém implantou alguma solução criativa para atender uma demanda diferente da que estava prevista inicialmente?

 

Sabemos como os profissionais de projeto têm que se desdobrar para tentar prever as mais absurdas possibilidades de uso que poderão acontecer até que aquele espaço seja descartado, renovado, substituído pelos usuários às vezes durante décadas de existência.

 

Para quem já leu o livro ou assistiu ao filme “Desventuras em Série” onde Meryl Streep faz a medrosa Tia Josephine que alerta os sobrinhos sobre os perigos mais improváveis que podem acontecer, podem relacionar a caricatura com a vida real de quem projeta ambientes.

 

Trabalhando na área de projetos, obras e manutenção durante alguns anos, posso dizer que muitas vezes me deparei com a necessidade de melhorias que impactaram como uma mutação de células no corpo humano e vejam como:

  • A mudança do escritório do térreo para o mezanino de uma loja, fez subir um cofre muito além da capacidade da estrutura metálica;

  • Escadas de vidro logo na entrada de uma loja de rua foram palco de um festival de escorregões no 1º dia chuvoso após a inauguração, quando os clientes entraram com os sapatos encharcados;

  • Um espelho d´água com seixos brancos em perfeita harmonia visual com um jardim tropical, tornou-se um lago de lama quando a água necessária à vida das plantas carregou a terra para dentro dele e as pedras ganharam um colorido não previsto;

  • Espelhos nas paredes da recepção ampliavam o espaço, mas, muitos funcionários que deviam estar concentrados nas suas tarefas, estavam sempre bem informados sobre as visitas à empresa.

 

Além de todos os conceitos, criatividade e tecnologia envolvidos na criação dos espaços, o projetista se colocando no lugar do usuário, no seu dia-a-dia, vivenciando e mantendo o lugar, produz a “alma” do espaço.

 

Nesse sentido o uso do sistema BIM e a simulação de uso pode ser excelente oportunidade de envolver o usuário nessa etapa do planejamento e a implementação de soluções como por exemplo, se:

  • o projeto prevê paisagismo, crie sistemas que facilitem a rega, a poda e o seu convívio com as pessoas;

  • a cobertura de vidro pretende que as pessoas vejam o céu, apresente facilidades na limpeza dela para que ela seja usada conforme o propósito;

  • se o trajeto entre o lavatório e o secador de mãos não pôde ser o ideal, o piso não pode ficar molhado nesse trajeto, há de ser prever materiais e elementos que de correção.

 

As notas alertando para itens imprescindíveis aos benefícios que o espaço concede às pessoas são arquivadas junto com os projetos, mas aquela pequena porta que faz com que o fiel entre curvado no templo cumpre sua função pela eternidade.

 

Essa “alma” do espaço nasce da harmonia entre os projetistas e usuários que analogamente a concepção de uma vida, desde a gestação contribuíram para o nascimento de um ambiente saudável e feliz.

 


 Rosemeire Demarchi é arquiteta e urbanista, se especializou em projetos de áreas de trabalho obtendo a certificação alemã “Geprüfter ArbeitsplatzExperte” – Mensch&Büro Akademie e através de sua vivência em mais de 20 anos trabalhando em empresas. Formada pelo Mackenzie em 1993, está entre os pioneiros projetando em BIM no Brasil e, em 2010 abriu o próprio escritório.

Priscilla Bencke

Arquiteta, pós-graduada em Arquitetura de Interiores, se especializou em Projetos para Ambientes de Trabalho na escola alemã Mensch&Büro Akademie.

Única profissional no Brasil com a certificação “Quality Office Consultant”.

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